Lilly Farias
Eu não trocaria ser quem eu sou por nada no mundo. Mas, de repente, todas essas imagens e todos esses números me imbecilizaram. E, quando eu olhei pro céu, aos 21 anos de idade, o presente, o passado e o futuro desabaram em mim como chuva de verão: unidos, torrenciais, uma coisa só.
O céu se tornou uma tela de cinema. E eu assisti tudo como sempre fiz: no escuro, na platéia, tentando me sentir como os outros se sentem, tão fora de mim. E o céu ia me engolindo em uma realidade que eu não sabia julgar se era real ou virtual. Tudo que eu amei loucamente, tudo que mais me fascinou eram, coincidentemente, as mesmas coisas que me aterrorizaram e me paralisaram. 
E o passado é como antigos papéis manchados de café... poemas escritos intensamente, quando a vida gritava de alegria e quando o coração era um velho louco nas ruas antigas de uma cidade fria e sem nome. 
Hoje, olhando para o céu, celebro a união dos tempos com a minha garrafa de vinho e o meu velho companheiro louco e desesperado.
Lilly Farias

   As primaveras costumavam ser lindas. Há alguns anos atrás, durante essa estação, eu costumava sonhar, escrever cartas, esperar e admirar as flores nascendo. Algumas pessoas não entendem a nostalgia causada pelo ciclo da vida.
   Eu nasci na primavera e na primavera me esqueci. Eu me perdi entre o sol e as flores. Eu rasguei as cartas e esqueci os sonhos e, na mesma sala vazia, diante da janela em que eu via flores, hoje só vejo sombras. Não que o ciclo da vida tenha mudado tanto assim, mas os olhos que fitam a janela ficaram nublados e o dia envelheceu.    E assim será pelas primaveras da minha vida.

Lilly Farias


   Vento, eu estou em silêncio. Quero que o meu silêncio seja uma prece. O mundo é tão grande e o meu coração é tão desesperado... ele sente muita vontade de fugir. Fugir pra bem longe daqui, para onde o passado seja uma remota lembrança sem nostalgia. Algum lugar onde eu consiga enganar o meu Mapa Astral, onde a minha vontade seja soberana e a minha mente possa voar livre sobre as árvores, sobre o azul do mar e sobre o tempo.
   Vento, por aqui a vida não faz sentido. Nesse lugar eu me perdi de mim, eu esqueci a minha ideologia, as minhas crenças, a minha razão e a minha poesia. Nesse lugar eu afastei de mim tudo que fazia o meu coração bater e agora ele está em silêncio, como eu.
   É por isso que eu quero ir embora. As ruas desse pequeno lugar são o retrato do meu passado que eu tento desesperadamente esquecer. E eu... Ah! eu queria tranformar o amor em ruína. E eu queria abandoná-lo esta noite.
   Não levo bússola, não levo mapas e nem fotografias. Todas essas coisas nos tornam ainda mais perdidos. Mas eu levo o meu triste coração como guia e eu te seguirei para onde for, vento. Para além de todas as coisas irá comigo o meu silêncio.